Resumo Da Poética

LIVRO I [Único]
Capítulo 1
O objetivo da poética é a produção de belos poemas. A arte faz três tipos de imitações, conforme o meio, o objeto e o modo. A pintura usa as cores e as figuras para imitar a natureza. As artes, em geral, imitam através do ritmo; da linguagem ou harmonia. A música, por sua vez, usa o ritmo e a harmonia; a dança, o ritmo; a epopeia e outros gêneros narrativos usam a linguagem para gerar seus efeitos.
Capítulo 2
Em suas narrativas, os autores imitam a ação das pessoas segundo o caráter de cada uma. A comédia imita os piores personagens e a tragédia, como a epopeia, os melhores.
Capítulo 3
As imitações também variam de acordo com a maneira: drama, tragédia e comédia. A tragédia tem origem dórica, enquanto a comédia surgiu nas aldeias e o drama vem do verbo “dram“, que significa agir.
Capítulo 4
O ser humano gosta da imitação. Por meio desta “aprende as primeiras lições”. A imitação dá prazer e provoca admiração. Seu desenvolvimento é natural na espécie humana. Entre os helenos, desenvolveu-se o gosto pelo texto em verso dividido na métrica iâmbica. Do iambo surgiu a comédia, depois, a epopeia e a tragédia, de acordo com a índole de cada autor. A cada nova transformação evoluía o teatro. A tragédia alcançou sua forma definitiva quando atingiu uma forma natural própria. O iambo foi a métrica mais adequada para expressão do diálogo, na linguagem corrente. A tragédia teve sua origem no ditirambo cantado nas festas a Dionísio e a comédia dos cantos fálicos.
Capítulo 5
A comédia imita os maus costumes de homens inferiores. Seu começo exato, no entanto, é ignorado. Os primeiros autores eram de cidades da Cilícia (Ásia menor). A epopeia, por seu turno, abrange uma história maior, enquanto a tragédia narra um enredo que se passa em um só dia e noite.
Capítulo 6
A tragédia imita uma ação elevada e completa com uma linguagem que visa provocar terror e compaixão, a fim de levar à purificação das emoções (catarse). Para isso, divide-se em seis componentes, a saber: o mito que imita a ação; os personagens; a elocução (interpretação da obra); o argumento pensado; a produção do espetáculo e sua melopeia (trilha sonora). Por imitar as ações, a trama dos fatos é a base mais importante da tragédia. Os atos e o enredo da história dão a finalidade da tragédia. Sem ação, a tragédia não se sustenta. Os caracteres dos personagens exibem a moral da peça, mas os fatos precisam estar bem intercalados para poder subsistir. Na pintura, a figura é tão importante, como o enredo na tragédia, a parte principal da obra de arte. A tragédia sobrevive como texto, sem necessidade das outras partes, pois depende apenas da competência de seu autor, o escritor.
Capítulo 7
Para ser completa, a tragédia deve descrever toda ação do começo, passando pelo meio até chegar o fim, em ordem cronológica. A beleza da peça está no ordenamento de suas partes e no tamanho de sua duração, que não deve se estender além do que a memória pode guardar. A totalidade da obra deve permitir a visão do conjunto e a lembrança viva de todos os passos da trama. Uma obra não deve ser tão curta que seja imperceptível, nem tão longa que não possa ser verossímil, além de seu desenvolvimento necessário.
Capítulo 8
Assim, a imitação das ações deve seguir uma linha evolutiva única e completa, para que se possa compreender o significado total da peça.
Capítulo 9
O autor ficcional não tem obrigação de narrar os fatos exatamente, como teria um historiador. Sua função é representar a possibilidade de modo verossímel e necessário para a trama. A obra literária, nesse sentido, está mais próxima da filosofia na busca de conceitos universais, enquanto a história procura descrever um caso particular da maneira que aconteceu na realidade, em um determinado momento. O escritor ficcional tem a liberdade de sair da narrativa tradicional e cria sua própria interpretação. O enredo deve imitar as ações, sejam estas reais ou imaginadas. Basta apenas que sejam verossímeis e possíveis. Os episódios que não mantêm conseguem parecer verossímeis são os piores. Os melhores textos fazem uso de eventos maravilhosos e surpreendem o público.
Capítulo 10
A ação simples deve ser única e coerente, sem peripécia ou reviravoltas na trama principal. A ação complexa admite mudanças através de descobertas ou peripécias que precisam ter suas consequências tiradas da coerência interna da narração. Toda história deve ser bem estruturada.
Capítulo 11
A peripécia provoca a mudança na linha de ação para um sentido contrário do esperado. O reconhecimento revela aquilo que os personagens desconheciam antes de acontecer. A peripécia e o reconhecimento criam uma forma mais bela de texto, pela admiração que provocam. Além desses recursos, a catástrofe é uma ação patética (comovedora) que causa a dor ou a morte em cena.
Capítulo 12
Na tragédia antiga, havia quatro divisões principais: o prólogo, o episódio, o êxodo e o coral, que aparecia na primeira intervenção do coro (párodo) e o canto fúnebre (estásimo ou kommos), que reunia os músicos e os personagens em cena final.
Capítulo 13
A tragédia mais bela é complexa. Os casos narrados são terríveis e comoventes. A trama dirige-se para um final único, com os personagens passando da felicidade para infelicidade. Pelo erro de um personagem de boa índole, a história se desenrola. Outras tragédias com dupla intriga entre bons e maus seguem o gosto do público. A comédia, diferente da tragédia, termina com um final feliz.
Capítulo 14
O enredo das peças literárias deve ser composto de tal maneira que provoque a compaixão no público, ainda que não sejam encenadas. O escritor deve buscar obter esse sentimento e o temor derivado da imitação da realidade. Os fatos históricos e as lendas tradicionais não podem ser alterados. Nas tragédias os personagens atuam conscientes ou não das consequências de seus atos. Tal reconhecimento também pode ocorrer no momento que a ação é executada. A falta de atitude do personagem em um espetáculo, no entanto, é o pior tipo de tragédia.
Capítulo 15
Os papéis são de boa qualidade, quando os personagens fazem escolhas corretas, premeditadamente. Suas ações, em segundo lugar, devem ser adequadas as suas características físicas. A verossimilhança é, então, uma característica dos personagens a ser observada e, por fim, devem ser coerentes com sua personalidade. As narrativas precisam levar a desenlaces próprios da trama, sem recorrer a efeitos especiais cênicos, como deus ex-machina. Esses recursos só podem ser usados em ações paralelas, fora da linha dramática principal, em situações passadas, que não interfiram na cena atual, que se passa no tempo presente. O objetivo de reproduzir os atos de personalidades elevadas, não é exclusivo da literatura, nas artes plásticas – pintura e escultura – também retratam esses modelos de forma idealizada.
Capítulo 16
A pior técnica de se produzir o reconhecimento em uma história é a feita por meio de sinais e marcas – muito usados em fábulas -, como manchas de nascença, cicatrizes ou objetos significativos – anéis, colares, taças etc. Depois, vem o reconhecimento pelo qual o autor faz o personagem se identificar a outro diretamente. A terceira de reconhecer acontece pela lembrança provocada por uma determinada ação. Contudo, o modo mais elaborado de se fazer uma descoberta se dá pelo raciocínio que liga eventos a uma conclusão. Uma variante dessa forma de silogismo é o paralogismo, onde o simples fato de se apresentar uma característica do personagem já o vincula a um determinado evento que ainda não aconteceu. Os melhores métodos de reconhecimento são aqueles que derivam do próprio desenrolar da história, sem necessidade de artifícios, como marcas ou declarações óbvias. O silogismo – conclusão extraída de premissas – é a outra forma de provocar um reconhecimento adequadamente.
Capítulo 17
As narrativas devem ser compostas sem contradições. A experiência do autor em relatar os acontecimentos é fundamental. Os argumentos enredados partem de assuntos gerais para os particulares em uma linha coerente.
Capítulo 18
Fazem parte da composição da tragédia o , onde estão os casos que desviam a ação principal, e o desenlace, que se produz desde o último nó até o final da história. Existem quatro tipos de tragédia, segundo as partes enfatizadas: a complexa, com peripécia e reconhecimento; a catastrófica; a de caracteres; e a episódica. A epopeia possui vários enredos, ao contrário da tragédia. Em todo caso, o coro deve contar como parte dos personagens das obras literárias.
Capítulo 19
A elocução pertence à técnica de representação do ator, que precisa saber como realizar um ato de fala – pergunta, ameaça, pedido ou explicação. A linguagem empregada faz parte do pensamento que visa demonstrar: refutar, comover ou aterrorizar, com ou sem recurso cênico.
Capítulo 20
As partes que compõem a elocução são as letras, sílabas, conjunção, nome verbo, artigo, flexão e proposição.
Capítulo 21
Trata de mostrar como os nomes são utilizados na elocução poética, com a língua helênica.
Capítulo 22
A elocução usada na produção de uma peça deve evitar a baixeza da língua vulgar e usar termos estrangeiros e metáforas que não são empregadas no cotidiano. Deve-se evitar também o barbarismo e os enigmas obscuros. O uso equilibrado dessas ferramentas ajuda a elevar a linguagem e a apurar as semelhanças entre os elementos da obra.
Capítulo 23
A imitação feita pela narrativa deve ter começo, meio e fim, para abranger toda a ação. Por conter vários episódios, os textos épicos são compostos por muitos acontecimentos ligados apenas de modo casual, sem que levem a um mesmo fim. Por isso, alguns autores preferem privilegiar uma linha princiapl do início ao fim, com alguns episódios paralelos. Nesse sentido, tragédia e epopeia seguem as mesmas diretrizes.
Capítulo 24
Diferente da tragédia, a epopeia não precisa de música ou de uma produção cênica, pois sobrevive integralmente na forma de texto, elaborado com peripécias e catástrofes, em uma linguagem eloquente estilizada, como a de Homero. A extensão e o ritmo são as principais diferenças entre a epopeia e a tragédia, portanto. Na tragédia, são apresentadas as partes importantes que se refletem nas atuações dos atores, em cena. Porém, na epopeia, muitos eventos podem ser mostrados ao mesmo tempo. O ritmo heroico da epopeia é mais grave e abrangente, como convém ao tema.
Na produção de uma obra, o texto deve usar o mínimo possível falas em primeira pessoa ou a voz do narrador. O autor deve se expressar, o menos que puder, seu ponto de vista. A atuação de seus personagens devem falar por si mesma. Os efeitos especiais fazem parte da tragédia e da epopeia. A farsa, na forma de paralogismo – sofisma -, quando se presume que uma coisa acontece por causa de outra e esta por causa daquela, circularmente [(A → B) → (B → A)], foi introduzida por Homero e adotada por seus sucessores. Os encadeamentos da trama precisam ser racionais e óbvios. Os absurdos são tolerados nas ações paralelas, no entanto, sem comprometer a fidelidade da narrativa principal. Esta, ainda que irracional, precisa parecer razoável, apesar dos absurdos. O criador tem que buscar o embelezamento da linguagem, quando a ação não for perturbada.
Capítulo 25
Como qualquer outro produtor – pintor ou escultor -, o escritor imitará as coisas existentes, passadas ou futuras, segundo as aparências ou idealizadas. Dois erros podem surgir durante a criação: essenciais ou acidentais; seja pela incapacidade do produtor ou má concepção do objeto. Representar o impossível é um erro admissível se atingir a finalidade de impressionar além do restante da obra. Porém, é injustificável se não consegue realizar o objetivo proposto. A ignorância do autor em relação à concepção do objeto é um erro menor do que sua imperícia ao executá-lo. Essa é a diferença entre não conseguir representar as coisas como deveriam ser ou como são. A expressão da fala ou o desempenho da ação são avaliados na sua elevação ou baixeza, de acordo com a característica do personagem. Na elocução, as dificuldades residem nas falas de duplo sentido que precisam ser entendidas no contexto da ação. O uso metafórico e de outras figuras linguísticas provocam esse tipo de situação. Quando surge uma contradição, será necessário observar as maneiras pelas quais as metáforas e outras figuras podem se adequar ao enredo. A persuasão é o principal objetivo da obra. As críticas que recebem recaem sobre a representação do impossível, do irracional, do prejudicial; do contraditório e tudo que for embaraçar a técnica e sua regras.
Capítulo 26
A melhor imitação é aquela menos vulgar. Os excessos agradam ao público mais grosseiro. A epopeia dirige-se a um público mais elevado e a tragédia aos rudes, sendo inferior, nesse sentido. Entretanto, essa crítica diz respeito à representação do ator e não à qualidade do texto, se a produção da peça seguir tal tendência. A tragédia também pode atingir seu fim, sem recorrer aos exageros da encenação. Pode, então, superar a epopeia ao assumir seus elementos característicos, deixando de fora os vícios interpretativos. Assim, a tragédia pode superar a epopeia, em sua finalidade de provocar a compaixão e o temor na plateia de caráter superior.

Fontes
ARISTÓTELES. Poética. – São Paulo: Abril Cultural, 1973.
__. Arte Poética. – Rio de Janeiro: Ediouro, s/d.

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