Sobre Apolo e Asclépio

O comportamento incoerente e imprevisível dos deuses descrito pelos poetas e dramaturgos era motivo de crítica entre os próprios helenos. Xenófanes de Cólofon (cc. 580-460 a.C.) atacava diretamente Homero e Hesíodo por “atribuírem aos deuses tudo o que para os homens é opróbrio e vergonha” (XENÓFANES, Fragmento 11). Platão (429-347 a.C.) propunha, na sua república ideal, o afastamento dos autores mentirosos (PLATÃO. República, liv. II, 377a-383c).
Asklepio de Epidauro

Estátua helena de Asklepios exposta no museu antigo do Teatro de Epidauro. Foto de Michael F. Mehnert.

Os registros remanescentes a respeito de Apolo (Febo ou Hélios, o Sol) e Asclépio (Esculápio) são fantasiosos ao extremo. Sobre ambos, dizem terem sido cultuados como deuses da medicina, embora Apolo também fosse patrono da beleza, das artes, dos rebanhos etc. Apolo era pai de Asclépio, cuja mãe era a ninfa Corônis, filha de Flégias, rei da Tessália. Acusada de adultério, Corônis foi morta por Apolo, num ataque de ciúmes. Ao saber que ela estava grávida de Asclépio, Apolo o arrancou de seu ventre, antes que fosse cremado. Entregou-o ao centauro Quíron, para que este o educasse. Asclépio aprendeu a usar as plantas medicinais, curar os ferimentos e doenças. Com esses conhecimentos, Asclépio ressuscitou Hipólito, provocando a ira de Hades (Plutão), deus do Inferno, que reclamou um castigo a Zeus (Júpiter). Este fulminou Asclépio e, por causa disso, Apolo flechou os Ciclopes que haviam forjado o raio. Tal vingança contrariou a vontade de Zeus que, então, sentenciou a expulsão de Apolo do Olimpo. Mais tarde, porém, Apolo seria restituído de seus poderes e designado a espalhar a luz por todo universo.
Asclépio continuou sendo honrado como um deus, principalmente em Epidauro, cidade do Peloponeso, onde nascera. Por vezes, ele aparecia em sonhos como um homem barbado com um cajado. D’outro modo, transformava-se em serpente, sendo por isso representado como uma cobra enrolada num bastão, origem do símbolo da medicina.
Quando Apolo era associado a Hélios, podia proporcionar tanto a saúde como a doença entre os mortais, já que o aquecimento do Sol na natureza pode fortificar todos os seres, como causar seca e muitos malefícios. Além disso, Apolo era responsável pela transmissão das profecias, através dos oráculos proferidos em Delfos. Semelhante aos outros deuses mitológicos, sua fúria poderia impor muitos males aos homens. N’As Metamorfoses, livro VII, Ovídio (42 a.C.-18) conta de uma peste provocada pela ira de Hera (Juno). Enquanto Hesíodo (séc. VII a.C.), em Os Trabalhos e os Dias (v. 90 e ss.) atribui a origem das doenças (nouson) ao descuido de Pandora, que as deixara escapar do pote de barro, presente de Zeus a Prometeu, criador dos homens.

Referências Bibliográficas

BORNHEIM, G. A. (org.). Os Filósofos Pré-Socráticos. – São Paulo: Cultrix, 1989.
COMMELIN, P. Mitologia Grega e Romana. – São Paulo: Martins Fontes, 2000.
HESÍODO. Os Trabalhos e os Dias. – São Paulo: Iluminuras, 1991
OVÍDIO. As Metamorfoses. – Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1983
PLATÃO. A República. – Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1990.